Washington All at Odds

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Washington às aranhas

John Kerry apenas verbalizou publicamente o que os EUA estavam implicitamente a fazer há ano e meio. Senão vejamos. A partir do momento em que a “linha vermelha” americana aplicada ao uso de armas químicas foi travada pelo receio de mudar o regime e piorar ainda mais a Síria, Washington cedeu a Teerão e a Moscovo mantendo Assad. Este, astutamente, pactuou com a entrega do arsenal químico em troca do compromisso oficioso de lutar contra a ascensão do ISIS, fórmula que convinha a todos. Os EUA, porque depois do Iraque, Afeganistão e Líbia, não tinham margem para outro desastre associado a uma intervenção militar. Moscovo, porque mantinha um aliado estratégico e o acesso ao Mediterrâneo. Teerão, porque não deixava cair um aliado xiita regional, fundamental na geografia de influência sunita da Arábia Saudita e Turquia, e porque isso lhe dava peso na negociação com os EUA sobre o nuclear. O sequestro do Levante pelo ISIS – com mãos e pés na Líbia, Nigéria, Egito, Líbano, Jordânia e Iémen – fez o resto: para Obama, já não chegam os ataques aéreos, é preciso reconquistar posições com botas no terreno. Essas botas são iraquianas e iranianas (no Iraque) e têm de ser sírias e iranianas (na Síria). Esta concessão a Teerão significa ainda uma coisa: as negociações sobre o nuclear estão a correr bem ao Irão. O timing ajuda o raciocínio. Washington não abre mão da negociação direta com Teerão nem cedeu à pressão de Netanyahu. A frente anti-ISIS no Iraque vai correndo melhor e precisa de uma frente semelhante na Síria. Nenhum grupo da oposição a Assad provou ter capacidade para derrotar o ISIS, e xiitas, cristãos e drusos sírios temem uma derrota de Assad. Tudo isto se resume nestes termos: os EUA nunca souberam o que fazer na Síria. Mais vale acertar o passo tarde do que nunca.

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