Maior controle dos bancos nos EUA
Dois anos depois do estouro da maior bolha financeira desde os anos 30, o governo dos Estados Unidos apresenta um plano para disciplinar o mercado, tornar os bancos menos propensos a aventuras e aumentar a segurança do consumidor e do depositante e, por extensão, de toda a economia. Neste caso, “toda a economia” tem o sentido mais amplo: hoje, o mundo inteiro paga o preço dos atos irresponsáveis cometidos em primeiro lugar nas instituições americanas. Esses atos foram facilitados por uma legislação permissiva, pela omissão das autoridades e também por erros na condução da política monetária. As inovações propostas pelo presidente Barack Obama são portanto bem-vindas, apesar do atraso. Não se poderia esperar de seu antecessor, o presidente George W. Bush, um esforço maior para disciplinar o setor financeiro.
Parte dos congressistas resistirá ao plano elaborado pelo Executivo, por julgá-lo intervencionista em excesso e nocivo ao funcionamento do livre mercado. Dirigentes do setor financeiro tentarão, provavelmente, impedir a adoção de regras mais severas de controle de seus negócios.
Grandes bancos ajudados pelo governo estão conseguindo com surpreendente rapidez o capital necessário para normalizar suas operações. Nove instituições de grande peso – entre estas o JP Morgan Chase, o Morgan Stanley e o Goldman Sachs – anunciaram na quarta-feira o reembolso de US$ 66,25 bilhões de ajuda fornecidos pelo Tesouro. Aceitarão a tutela, se forem capazes de sustentar-se, a partir de agora, sem depender do governo?
Ao apresentar o plano, o presidente Obama procurou antecipar-se às acusações de intervencionismo. O sistema, segundo ele, funcionava sobre areia movediça. A regulação proposta não deverá limitar, segundo ele, a criatividade e a inovação. Deverá apenas favorecer a robustez do mercado e a transparência de suas operações, facilitando ao consumidor o entendimento dos negócios oferecidos.
Ao mencionar os objetivos de transparência e de segurança para o aplicador, Obama tocou num dos pontos mais defeituosos do sistema: a bolha foi criada por uma sequência de operações obscuras, montadas à margem dos controles contábeis dos próprios bancos e ininteligíveis para a maioria das pessoas.
Na essência, não há muita originalidade nas mudanças propostas pelo presidente dos EUA. O plano inclui, em primeiro lugar, um novo esquema institucional de supervisão e controle, com a criação de dois organismos ligados ao Executivo e a ampliação dos poderes do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). O Fed ganhará autoridade sobre todas as instituições – bancárias e não bancárias – importantes para a estabilidade do sistema. Antes, o Fed tinha poderes para controlar os bancos em sentido estrito (isto é, os bancos comerciais). Não supervisionava outras entidades, como bancos de investimento, onde foi gerada a maior parte das operações mais desastrosas. No Brasil, todo o sistema está sujeito a controle federal há muitos anos e a supervisão realizada pelo Banco Central já era muito mais ampla que a exercida tradicionalmente pelo Fed.
Também estão previstas no plano exigências maiores de capital e de liquidez para instituições de todos os tipos. Os bancos terão menor liberdade para conceder empréstimos, porque serão forçados, se as mudanças forem aprovadas, a manter uma proporção mais reduzida entre as aplicações e o capital. No jargão técnico, serão obrigados a reduzir sua alavancagem.
Limitações desse tipo são observadas há anos no Brasil. São estranhas ao sistema bancário americano porque os Estados Unidos se atrasaram na adoção das chamadas normas de Basileia, recomendadas pelo Banco de Compensações Internacionais (Bank for International Settlements, BIS). Parece brincadeira o presidente Obama ter pedido ao Comitê de Basileia sobre Supervisão Bancária regras mais severas para aplicação internacional.
Uma das boas inovações do plano é a proposta de regras para as agências de classificação de risco, em geral ineficientes na prevenção de crises. Um dos objetivos é limitar conflitos de interesse, observados, por exemplo, quando as agências prestam serviços aos clientes sujeitos a avaliação.
O detalhamento do plano será complicado e a tramitação no Congresso poderá ser politicamente difícil. Mas o passo inicial é altamente positivo.
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