The Case of Sean: Ethnocentrism or Inferiority Complex?

Edited by Jessica Boesl

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Caso Sean: etnocentrismo ou complexo de inferioridade?

Marcelo Ambrosio

Peço desculpas aos leitores que postaram comentários a respeito do artigo sobre o caso Sean e o marketing. Por uma falha no meu sistema aqui os comentários não foram para o ar, dando a entender que são retidos. Acabei de publicar todos com grande satisfação, sobretudo pela pluralidade das análises. Continuo com a firme convicção de que David Goldman tem o direito de criar seu filho biológico, tanto quanto a obrigação de reconhecer quea mãe do menino, mesmo o tendo sequestrado, não teve o direito cassado ainda que post-mortem. Porisso é importante que a decisão final estabeleça o espaço de cada um muito claramente. Sean veio para o Brasil contra a vontade do pai, mas era inegavelmente feliz com a família da mãe. Se o será com o pai é uma incógnita que a campanha organizada por David junto à mídia dos EUA deixou espertamente de abordar.

Também reafirmo a minha crítica quanto à forma colonialista, ou imperialista, para usar um termo gasto mas adequado, como a imprensa americana costuma tratar episódios dessa natureza. Citei o caso dos dois pilotos americanos responsáveis pela queda do Boeing da Gol por ter lembrado da campanha montada por redes de tevê de Atlantic City, onde ambos viviam, em torno do “resgate” de dois “heróis” nacionais mantidos em cativeiro em um estranho e selvagem país da América do Sul. Quem leu o artigo desrespeitoso e irônico escrito pelo repórter do The New York Times que os acompanhava a bordo – e que mentiu em juízo no Brasil – sabe bem do que estou falando.

Joe Lepore e Jean Paul Paladino não estavam presos no Rio, como os jornais e as tevês fizeram questão de martelar por 45 dias, mas ficaram confinados no melhor hotel da praia de Copacabana por decisão do proprio consulado, que “temia por sua segurança”. É esse o comportamento que funciona como gasolina na fogueira. Ninguém atacaria os dois pilotos na rua por considera-los cúmplices na morte de 199 pessoas inocentes. Este não é um país de selvagens. Eles seriam tratados como protagonistas de um dos mais tristes e lamentáveis episódios da aviação brasileira e deveriam ter continuado, como estavam à disposição da Justiça brasileira enquanto o processo criminal – que acabou arquivado – estivesse correndo. Não eram, não são, e nunca serão heróis. Tiveram um privilégio resultante da pressão oficial sobre a leniente chancelaria brasileiram, privilégio esse que permitiu a dois sujeitos diretamente envolvidos em quase 200 mortes escaparem de um indiciamento correto por homicídio culposo. Isso jamais foi citado na tevê americana. Tanto nesse caso quanto no de Sean, a justiça local pouco importa.

Vale lembrar que o problema de David Goldman é parecido, embora com background diferente. Ninguém envolve o Departamento de Estado em uma polêmica de nível internacional dessa se não convence os diplomatas de que o cidadão americano é refém e se encontra em tamanho perigo que vale a pena arriscar até arranhar relações estáveis com outros governos em nome de uma intervenção inoportuna e inconveniente, uma vez que a Justiça de cada país é soberana. É uma questão de escala dos problemas; Brasil e EUA tem contenciosos muito mais sérios e delicados para serem discutidos no nível da secretária de Estado do que a disputa da guarda de uma criança. Mas Hillary Clinton também enxergou ganhos políticos domésticos nesse envolvimento, então que se dane o fato de se intrometer onde não há espaço para tanto.

Sean, aliás, é cidadão brasileiro também. Mas isso não faz nenhuma diferença para os aliados de David na carriére ou nas redações. O que valeu no caso foi o bom e velho etnocentrismo que transforma cada americano fora de suas fronteiras em um herói independentemente do que esteja ocorrendo à sua volta, ou do direito do outro lado. David Goldman montou um site no qual pedia ajuda para recuperar o filho. Fechou negócio com a NBC em troca do jatinho e da entrevista exclusiva. Agora está processando a família materna do próprio filho para recuperar o que gastou com o processo, sempre batendo na tecla de que o menino foi “salvo” de um destino menor do que o merecido a todos os que nascem em solo americano. Como empreendedor, segue o espírito dos “founding fathers”. Vai acabar rico.

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