The Lost War?

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A guerra perdida?

Tempos houve em que a guerra do Afeganistão era a “guerra boa”: os Estados Unidos tinham sido atacados no 11 de setembro. E, excetuando as franjas lunáticas que não contam para a história, o mundo aplaudiu o esforço norte-americano para limpar o Afeganistão de uma quadrilha fanática que oferecia santuário a Osama Bin Laden.

A guerra do Afeganistão, e a tentativa ocidental de tornar o país um espaço mais habitável, era o contraponto à “guerra má” no vizinho Iraque: uma guerra sem sentido nem justificação, motivada pela ganância petrolífera de Washington – ou, em reatualização freudiana, uma forma do filho superar o pai.

Essa distinção entre “guerra boa” e “guerra má” começou a ser diluída pelo tempo. Hoje, ninguém chora Saddam Hussein e, contra todas as expectativas, o Iraque conseguiu um mínimo de ordem e segurança, ainda que esse mínimo, sempre precário, tenha determinado a destruição da estrutura política sunita do país, ou seja, a emergência do Irã como ator principal no palco do Oriente Médio.

Mas se existem motivos de tímido alívio no Iraque, a “guerra boa” do Afeganistão corre o risco de se tornar na guerra perdida. Ou, mais propriamente, na guerra abandonada. Porque existem sinais de que os Estados Unidos e a Grã-Bretanha estão dispostos a esse “harakiri”.

Barack Obama, no mais insensato discurso do seu mandato, já avisou que julho de 2011 será a data da despedida. Não sou especialista militar, mas qualquer pessoa racional formula a questão funesta que o “Sunday Telegraph” coloca no editorial de ontem: e se até julho de 2011 o Taleban conceder uma “ilusão de estabilidade” para atacar depois? Não será o estabelecimento de datas, sem qualquer concessão ou referência à situação real no terreno, uma rendição estratégica perante o inimigo?

David Cameron, premiê britânico, diz que não. E embora seja mais generoso do que Obama, Cameron repete a posição oficial do G8 para estabelecer um ultimato: cinco anos, máximo, eis o tempo que o presidente afegão Hamid Karzai tem para colocar a casa em ordem.

O ultimato é interessante por dois motivos, ambos lamentáveis.

Primeiro, porque sinaliza a vontade irreprimível da Otan em deixar o Afeganistão a qualquer preço, uma disposição que não anima as tropas e só fortalece os inimigos.

Mas, sobretudo, porque coloca Karzai com uma bomba nas mãos: um convite para lutar o Taleban; e, em caso de falhanço nos próximos cinco anos, a certeza de que será devorado por ele quando as tropas da Otan abandonarem Cabul. Será esse o melhor incentivo para que o governo afegão possa ser implacável com a insurgência?

O 11 de setembro, contrariamente ao que foi dito ou escrito, não significou o início de uma nova era. Significou, pelo contrário, o fim de um longo ciclo de recuos ocidentais face aos inimigos islamitas – um ciclo que começou com a chegada do aiatolá Khomeini ao poder em 1979 e que se foi multiplicando, em renovados atos de terror, em Mogadíscio, Cabul, Nairói. E finalmente Nova York.

Retirar do Afeganistão, entregando o país aos seus antigos carniceiros, não será apenas mais um derrota do Ocidente e uma traição indesculpável aos dois mil homens que lutaram no terreno e não regressaram mais.

Será a certeza de que a guerra que não se venceu no Oriente Médio acabará, cedo ou tarde, por nos visitar dentro de casa.

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