Afghanistan after WikiLeaks

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O Afeganistão depois da Wikileaks

Massive leak of secret files exposes true Afghan war,” escrevia o “The Guardian” na primeira página, na segunda-feira. Ao longo de catorze páginas, o jornal inglês fez uma avaliação extremamente pessimista da guerra no Afeganistão. Esta avaliação foi feita com base em dezenas de milhares de documentos militares norte-americanos com a classificação de ‘secreto’ fornecidos pela organização Wikileaks. Nos EUA e na Alemanha, o “New York Times” e a “Der Spiegel” também deram imensa atenção a este assunto. A leitura dos artigos baseados nos documentos fornecidos pela Wikileaks deixou-me com uma conclusão paradoxal.

Por um lado, não revelam nada de novo do ponto de vista estratégico. O “The Guardian” escreve no seu editorial de segunda-feira que os documentos mostram uma paisagem completamente diferente daquela que o jornal estava habituado a ter do Afeganistão. Isto foi uma novidade completa para mim. Nos últimos anos, os jornais internacionais têm publicado imensos artigos sobre os dramas e as dificuldades da guerra no Afeganistão. Quem tenha prestado atenção aí a um décimo do que foi publicado nos últimos anos não pode ter ficado nada surpreendido com as ‘revelações’ desta semana.

Por outro lado, acho que os artigos do “Guardian”, do “New York Times” e da “Der Spiegel” terão consequências estratégicas importantes na Europa. Os artigos reforçam as dúvidas dos governos e eleitorados em relação às operações militares no Afeganistão. Fomos para o Afeganistão carregados de ilusões e com as melhores intenções. Infelizmente, esquecemo-nos de duas coisas essenciais. A primeira é que o inimigo também vota. Como era de esperar, o inimigo votou por combater. A segunda tem a ver com a geopolítica regional. O destino do Afeganistão é vital para países como o Paquistão, a Índia, a China, a Rússia e o Irão. Para nós não é.

O que o “Guardian”, “New York Times” e a “Der Spiegel” fizeram esta semana foi tornar claro o preço político, humano e económico das nossas ilusões e da nossa falta de atenção nos últimos anos. Digamos que os artigos do “Guardian”, “New York Times” e da “Der Spiegel” forneceram aos mais distraídos as legendas para a guerra no Afeganistão.

As legendas estão a deixar muita gente chocada. Chocada com a violência, o caos, os erros e a destruição que sempre caracterizaram a guerra. Chocada com as missões das forças de operações especiais. Como é perfeitamente natural numa guerra, a missão destas forças tem sido matar os inimigos das forças da NATO. O problema é que hoje em dia na Europa os nossos guerreiros são uma coisa pouco apreciada. Dizemos que queremos ganhar mas não queremos combater. Não queremos, sobretudo, viver com a ambiguidade que rodeia a guerra. Chocada, finalmente, com as mortes dos civis. Os EUA e a NATO nunca tiveram no terreno os números de infantaria necessários para ter uma hipótese de concretizar alguns dos seus objetivos políticos. O resultado foi uma dependência excessiva em relação ao poder aéreo. A falta de informações credíveis levou a que o uso deste poder aéreo matasse um número de civis inaceitável do ponto de vista político.

A opção da Administração Obama por uma doutrina de contra-insurreição levou o general Stanley McChrystal a adotar regras de empenhamento muito restritivas para as forças da NATO. Os países europeus aplaudiram politicamente a opção pela contra-insurreição mas a dura verdade é que esta opção exige muito mais infantaria, mais paciência estratégica e aumento dos riscos que os soldados correm no teatro das operações. O aumento do número de baixas nos últimos meses é a melhor prova disto. Nenhum país europeu está preparado do ponto de vista político e militar para uma coisa destas. A contra-insurreição exige ficar no Afeganistão e tentar controlar a fronteira com o Paquistão. Os países europeus e o Canadá querem sair. Onde é que isto deixa a NATO?

“Paradise General”

Fui porque precisavam de mim.” Dave Hnida, um médico casado e pai de quatro filhos de Littleton (Colorado), ofereceu-se como voluntário para o Iraque pela segunda vez em 2007. Em “Paradise General. Riding the Surge at a Combat Hospital in Iraq” (Nova Iorque: Simon & Schuster, 2010), escreve sobre o que foi ser médico num hospital de campanha equipado para cuidados de emergência e cirurgia num período extremamente violento. “Paradise General” é um livro essencial para compreender o que é a medicina na guerra.

Fugas

90 mil documentos militares dos EUA fornecidos pela Wikileaks ao “Guardian”, “New York Times” e à “Der Spiegel” deram origem a um paradoxo: por um lado não revelam nada de novo sobre o Afeganistão; por outro terão consequências estratégicas na Europa

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