Obama and the Change That Never Happened

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Obama e a mudança que não chegou a ser

Melhor ou pior, a política na América é diferente da que temos por cá. As campanhas são distintas, as big issues são distintas e a relação entre os cidadãos e os candidatos – e depois entre os cidadãos e os eleitos – é outra que não a que estamos habituados. Alexis de Tocqueville, na sua Democracia na América, diz que a grandeza dos Estados Unidos não está em serem mais iluminados do que as outras nações, mas sim na sua habilidade para reparar os erros. Os americanos, quando vão às urnas, fazem-no não apenas como um processo necessário para garantir a ocupação dos cargos políticos mas sobretudo para – em cada momento – reparar erros ou confirmar boas escolhas. E os políticos, na América, estão atentos e respeitam a mensagem expressa pelos cidadãos, condicionados por um extraordinário sistema de freios e contrapesos que – so far – tem funcionado muito bem.

Estas “eleições intercalares” são reflexo do sistema, prova da singularidade da política americana e – neste caso – deverão funcionar como um freio à Administração Obama. Depois de uma onda azul ter tomado conta do país em 2008, sob o mote da mudança e da esperança, temos um agora novo equilíbrio político: os democratas têm a presidência mas perdem a maioria confortável no Senado e vêm os republicanos assumir o controlo da Câmara dos Representantes. A vitória moral, desta vez, foi do Partido Republicano e Obama levou um cartão amarelo. Podemos considerar, na análise dos resultados, três chaves analíticas: a primeira parte exactamente desta lógica de freios e contrapesos e do facto de, na tradição americana, ser comum o Partido que está na Casa Branca ter resultados menos bons nestas midterm elections; outra justificação, pouco convincente para a maioria dos americanos, assenta nos efeitos colaterais de factores que ultrapassam a Administração Obama, como más políticas da Administração anterior, ou a conjuntura de crise internacional; por fim, temos uma terceira explicação, que é a de que os americanos, na sua maioria, decidiram vetar a mudança proposta pelo Presidente, e querem agora substituir a esperança pela prudência e voltar a um estilo de governo menos carismático e mais pequeno, como pode ver-se pela relevância assumida pelo Movimento Tea Party.

Para este veto contam naturalmente os números (como o da taxa de desemprego a rondar os 9,6%) e os fracos indicadores económicos. E conta também o efeito de determinadas medidas e políticas – o Plano de Saúde, a “Economic Stimulus Bill”, ou o excesso de legislação no sentido da protecção ambiental – que não se ajustam ao modo americano de fazer política. Mas, determinante neste desfecho pouco favorável ao Presidente da mudança terá sido também – e por ironia do destino – a própria forma como foi eleito. Barack Obama assentou a sua campanha num modelo que foi de ruptura, mas mais ideológico do que programático, com conceitos fortes que criaram uma espécie de idealismo humanitário (a “mudança”, a “esperança”, a política “pós-partidária” e a ideia de que “bastava estarmos juntos” para conseguir). É um modelo entusiasmante, mas arriscado num país como os Estados Unidos, onde os valores da República permanecem fortes e ditam prudência e moderação na forma e alcance do poder político, e onde os eleitores continuam a rever-se nos partidos.

O candidato Obama conseguiu criar o momento, conseguiu criar um sonho para muitos americanos, conseguiu que muitos que nunca antes haviam votado se deslocassem às urnas, numa onda de mudança e de esperança. Mas o Presidente Obama não viu com atenção o reverso da medalha. Muitos dos que votaram nele (jovens, minorias) constituem uma camada mais volátil do eleitorado que ele não conseguiu fidelizar, e mais importante: na América, a política não vive de sonhos, de momentos, de ondas de euforia, de carisma e comoção. Na América, a política é indissociável da realidade, da aprovação constante dos cidadãos, e de um conjunto de princípios, regras e limites que não podem ser ultrapassados.

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