Há uma grave omissão na maior parte do noticiário –e, por extensão, dos comentários– a respeito do trecho do discurso de quinta-feira em que o presidente Barack Obama se referiu às fronteiras de Israel e do Estado palestino.
Todas as manchetes se basearam na pressuposição de que Obama está pregando –pela primeira vez em sua administração– a adoção das linhas fronteiriças de 1967 como base para o futuro Estado palestino. Falso. A frase completa é a seguinte: “As fronteiras de Israel e do Estado palestino deveriam basear-se nas linhas de 1967 COM TROCAS [de terras] ACERTADAS DE COMUM ACORDO”.
Essa parte que pus em maiúsculas muda toda a impressão causada pela menção às fronteiras de 1967.
Explico: se não houvesse o adendo, Israel teria que se retirar de todos os pedaços do território palestino que ocupa, inclusive de partes de Jerusalém Oriental que os palestinos reivindicam como capital de seu futuro Estado, mas que Israel diz que é uma cidade indivisível.
O adendo, no entanto, permite que Israel mantenha quanta terra quiser, na forma de assentamentos implantados em terras que resoluções da ONU dizem que são dos palestinos, inclusive em Jerusalém Oriental.
Basta, pelo teor do discurso de Obama, trocar o que está ocupado pelos colonos judeus por áreas de Israel que não interessam aos israelenses.
Além disso, Obama reiterou antiga fórmula da diplomacia norte-americana, segundo a qual “a completa e gradual retirada das forças israelenses [dos territórios ocupados] dependeria da habilidade das forças palestinas de segurança e de outros acertos a serem acordados para evitar o ressurgimento do terrorismo”.
É óbvio que Israel tem todo o direito de viver sem a sombra do terrorismo ameaçando seus habitantes, mas está fora do alcance de qualquer esquema de segurança impedir de fato o terrorismo, enquanto houver uma só pessoa disposta a matar e morrer no mesmo ato. O 11 de Setembro é uma prova cabal.
Portanto, o discurso de Obama, na parte referente à questão Israel/palestinos, é inócuo e sem novidades.
Como analisou Elliott Abrams, especialista do Council on Foreign Relations, “os comentários do presidente sobre o conflito israelenses/palestinos não levam a parte alguma.
É chocante que ele não sugira nenhuma ação: nem reunião, nem enviado especial, nem uma sessão do Quarteto [o grupo formado por Estados Unidos, Rússia, União Europeia e ONU, que tenta a mediação entre as partes], nem um convite para Washington”.
Moral da história: convém sempre ler mais do que a manchete do dia.
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