O dilema americano
Os americanos têm de resolver se vão puxar sua economia do atoleiro com mais incentivos fiscais ou se vão continuar inundando os mercados com dólares para facilitar os negócios. O dilema ficou claro depois do pronunciamento do presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), Ben Bernanke, numa reunião de banqueiros em Atlanta. A primeira solução é a preferível para o Brasil e outros países prejudicados nos últimos dois anos pela forte depreciação da moeda americana. A moeda excessiva emitida pelo Fed transborda para os mercados internacionais e afeta os mercados de câmbio. A valorização do real, uma das consequências dessa política, encarece os produtos brasileiros em moeda estrangeira e torna a indústria nacional menos competitiva e menos capaz de criar empregos.
Desde o agravamento da crise, em 2008, as autoridades americanas têm recorrido ao mesmo tempo a dois tipos de política para promover a reativação da economia. Do lado fiscal houve aumento de gastos e corte de impostos. Do lado monetário, os juros básicos foram mantidos entre zero e 0,25% ao ano e, além disso, o Fed se dispôs a absorver enorme volume de títulos públicos em circulação no mercado. Na rodada atual, a segunda, foi programada a compra de papéis no valor de US$ 600 bilhões.
Esta segunda fase de afrouxamento monetário, com encerramento marcado para o fim do mês, foi muito criticada por autoridades de outros países, por seus efeitos no mercado de câmbio e também porque o excesso de dinheiro, segundo vários analistas, facilitou a especulação com produtos básicos.
Dirigentes do Fed já indicaram a disposição de manter os juros baixos por longo tempo, mas uma terceira rodada de compras de títulos parece fora de consideração. O fim dessa política seria o primeiro passo para uma estratégia monetária menos expansionista.
Mas o fim dessa rodada coincide com uma nova piora do quadro econômico americano. Os últimos dados sobre o crescimento da atividade e sobre a geração de empregos foram considerados decepcionantes. No primeiro trimestre o PIB cresceu em ritmo equivalente a apenas 1,8% ao ano. Cadeias de abastecimento foram prejudicadas pelo terremoto seguido de tsunami no Japão. No mês passado foram criados 54 mil empregos. As projeções do mercado financeiro indicavam algo próximo de 160 mil.
Na quarta-feira, um dia depois da conferência de Bernanke, foi divulgada a nova edição do Livro Bege, um panorama econômico montado com informações dos 12 distritos do Fed. O tom foi um pouco menos sombrio que o da palestra, mas o presidente do Fed certamente conhecia todos os dados quando preparou seu pronunciamento.
Não está claro se o enfraquecimento da economia americana é passageiro ou se os dados negativos indicam uma nova tendência de estagnação. Mas, segundo Bernanke, é preciso agir. A melhor saída, segundo ele, é prolongar os incentivos fiscais e programar um esforço de longo prazo para arrumação das contas públicas. O presidente Barack Obama já se declarou disposto a considerar a extensão dos estímulos a empresas e trabalhadores.
O grande problema está no Congresso. Republicanos prometem promover um grande corte dos gastos federais, apressando o ajuste das contas. Além disso, o governo enfrenta dificuldades para conseguir uma elevação do teto da dívida pública, hoje fixado em US$ 14,3 trilhões. O Executivo precisa obter a aprovação dessa mudança até junho. Provavelmente a conseguirá, mas o prolongamento das medidas de estímulo implicará negociações muito difíceis.
Sem o impulso fiscal e sem a expansão monetária, a recuperação da economia americana será muito difícil. Nenhuma contribuição ao crescimento virá da Europa, atolada nos problemas dos países superendividados.
Se os americanos optarem pelo prolongamento dos incentivos orçamentários, jogarão para o longo prazo graves problemas fiscais. Mas poderão resolvê-los mais facilmente num quadro de maior prosperidade. Os ganhos a curto prazo poderão ser consideráveis para todo o mundo.
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