Goodbye Middle East, Hello Far East

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O comandante-em-chefe Barak Obama não assumiu a doutrina Aiken no Afeganistão. George Aiken foi o senador republicano que na guerra do Vietnã recomendou que os EUA deveriam simplesmente “declarar vitória e cair fora”. O desfecho no Vietnã foi caótico (para os americanos) com a imagem inesquecível de debandada de helicópteros do telhado da embaixada na ex-Saigon.

O anúncio de redução de tropas americanas no Afeganistão (33 mil soldados até o final de 2012) foi um daqueles lances de Obama em que ele se desdobra para fazer média com todos e frustra meio mundo. Analistas e humoristas não perdoaram e repetiram que o presidente quer partir e quer ficar. O senador Aiken teria ficado irritado.

Mas, no final das contas, é o início do desengajamento dos EUA da mais longa guerra de sua história. O negócio é cair fora, sem declarar vitória em uma guerra que gerou tanto desgaste e pouca glória. Seria ridículo declarar vitória. Basta ver a sucessão de hediondos e espetaculares atentados do Talibã nos últimos dias. De qualquer forma para os americanos, existem as razões óbvias de fadiga de guerra, sem esquecer que o Afeganistão é um buraco, mas o buraco fiscal americano conta mais. De olho na sua campanha de reeleição (e o mesmo esta sendo feito pelo batalhão de pretendentes republicanos), Obama lembrou que o foco agora é doméstico. Numa expressão usada comumente por estes dias nos EUA, fala-se que a prioridade é reconstruir pontes em Kansas City e Baltimore e não em Kandahar e Bagdá.

O desengajamento regional é profundo. mas não extremado e muito menos imediato. Os americanos seguirão envolvidos no Afeganistão (e tropas ficarão lá por muito tempo em tarefas de contraterrorismo e não mais de contrainsurgência ou de construção em um país que parece de conserto quase impossível), no Iraque e em várias partes do Oriente Médio e África do Norte. Mas o zelo missionário que se seguiu aos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 perdeu a intensidade.

E não se trata apenas da consideração orçamentária. Mas também dos limites de atuação geopolítica, no contexto daquilo que o historiador Paul Kennedy chamou de “superextensão imperial”. Um pais precisa estabelecer a correspondência entre recursos e fins. Cair fora do Oriente Médio e de outros buracos quentes nas imediações irá permitir aos americanos concentrar seu poder de fogo estratégico, militar e fiscal em outras partes da Ásia, no Extremo Oriente, mais para as bandas da China. O comandante dos fuzileiros navais, general James Amos, não esconde seu projeto de deslocar para bases no Pacífico tropas liberadas do Afeganistão e Iraque. A hegemonia americana exige cada vez mais investimentos nos corredores navais ao redor da China.

É isto, aliás, que desejam aliados (Japão, a destacar) e mesmo não aliados dos EUA na região da Ásia-Pacifico (Vietnã). China, Vietnã e outros países da região estão envolvidos em disputas sobre ilhotas e recifes no Mar do Sul da China. As reinvindicações de Pequim acontecem quando o regime comunista ganha tonalidades cada vez mais nacionalistas (uma conveniente troca de ideologia e mensagem no país do leninismo de mercado).

Os chineses se inquietam com os vietnamitas e os americanos tomaram partido do adversário da guerra nos anos 60 e 70 (que na sequência teve um breve conflito com a China). Os chineses aumentam sua capacidade naval e seu primeiro porta-aviões vem aí. Militares e diplomatas chineses advertem para os americanos não “brincarem com fogo”, assim como vários países asiáticos envolvidos em disputas fronteiriças com Pequim.

Não há dúvida que a China é o único país que ameaça a supremacia global dos EUA (e estamos indo aqui muito além de economia). Existe este ponto de inflexão, com transferência de recursos estratégicos e militares americanos do Oriente Médio para a região da Ásia-Pacífico para conter a China. O drama é que os americanos precisam dos chineses também para sua reconstrução doméstica.

Para Obama e sucessores, será um desafio tirar a média. O atual presidente anda aos trancos e barrancos com esta prática. Vamos ver os próximos. Existe fadiga de guerra hoje nos EUA. Mas a história tem seus caminhos tortuosos (ou circulares). Nunca se sabe. Um dia, os americanos poderão estar novamente, por causa da China, em guerra no Vietnã, aquele do senador Aiken.

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