Ocupar Wall Street, a ponte do Brooklyn e o espaço político
Eu fico com um pé atrás quando a moçada (embora aqui haja também o grupo das “vovós pela paz”) marcha em Nova York com a benção da classe dominante da esquerda-celebridade, gente como Michael Moore, Susan Sarandon, Cornel West e o vovô Noam Chomsky. Mas, provando que eu sei linguismos finos, estes protestos difusos encampados no movimento “Ocupem Wall Street” pegam o zeitgeist 2011.
Para a moçada, a praça Tahrir, no Cairo, é aqui mesmo agora em Nova York, no Zuccotti Park (perto do Marco Zero dos atentados do 11 de setembro), acampamento do movimento. O protesto é, para dizer o mínimo, maximalista e vago. Tem palavras-de-ordem contra a ganância capitalista, desigualdades sociais e o governo corrupto que resgatou Wall Street. Existem propostas mais específicas de alguns participantes como acabar o dinheiro(?). Esta proposta faz sentido a jovens entrevistados no fim-de-semana como Erin Larkins, estudante de pós-graduação da Universidade de Columbia. Ela e o namorado devem US$ 130 mil de empréstimo educacional.
Como falei (e bonito), há o zeigeist. É o espírito dos tempos. Existem jovens com alto nível educacional (e outros menos) que tinham altas expectativas. O que temos hoje é um desemprego teimosamente alto, uma economia que patina, uma frustração com as promessas de Barack Obama (mesmo entre os jovens que votaram nele) e decepção generalizada com a classe dominante dos políticos (democratas e republicanos). O deputado democrata Charlie Rangel (um símbolo do que existe de mais atrofiado e corrupto no Congresso) foi recebido friamente e até intimidado por um militante quando apareceu para emprestar solidariedade (não dinheiro) no Zuccotti Park.
Wall Street, de fato, se safou do pior da crise de 2008. Claro que não comove muito mais, quando o país resvala para a recessão, o presidente Obama lembrar que seu pacote de resgate aos bancos impediu um colapso financeiro ou uma volta da depressão (é verdade). Pouco consolo para uma moçada que hoje se sente deprimida.
A moçada se diz inspirada na primavera árabe e nos jovens “indignados” da Espanha, assim como de outras partes do mundo subemergente. Diz que o movimento sem liderança (os sindicatos estão se metendo, além da esquerda-celebridade) quer restaurar a democracia nos EUA. Ué, o que existe agora?
Em Nova York, capital da mídia mundial, não se dava muito atenção ao movimento. Agora está dando e o mundo também. A polícia ajudou com alguma brutalidade (nada, obviamente, no padrão Bashar Assad de qualidade) e a marcha no sábado pela ponte do Brooklyn, que resultou em mais de 700 presos, garantiu um cartão postal ao protesto. Casamento perfeito no espetáculo. Polícia atuou como polícia e agitadores agiram como agitadoresna ponte e havia ativista implorando para ser preso.
Difícill saber se o movimento “Ocupem Wall Street” vai decolar para valer. De fato, ocupou espaço político e na mídia, além das expectativas dos participantes. Agitações semelhantes estão tendo lugar em outras cidades (mas somente em Boston o movimento já é mais significativo, embora protestos tenham crescido também em Chicago e Los Angeles). A idéia em Nova York é persistir acampado em Zuccotti Park por meses a fio (mais fácil para quem está desempregado ou desocupado). Muito vai depender de como a polícia reagir (ou não) e a capacidade de fagulhas gerarem incêndios políticos. Nesta próxima quarta-feira, um teste importante, com a programação de outra manifestação, com apoio sindical.
O movimento bate na tecla que ele representa 99% da população contra 1% dos privilegiados. Bom slogan, mas 100% errado. De novo, “Ocupem Wall Street” captura o zeitgeist de banzo econômico, decepção com políticos, uma classe média espremida e aumento do índice de pobreza. É saudável que haja esta agitação, em contraponto ao Tea Party, o movimento conservador que no começo parecia folclórico e ridículo, com integrantes fantasiados de americanos do final do século 18, mas se mostrou consistente e em condições de fixar a agenda do país, em torno de questões como disciplina fiscal e governo mais enxuto. O azar é que o Tea Party pode devorar o próprio Partido Republicano com o seu maximalismo e testes de pureza ideológica.
Nada errado com cafeína política do outro lado da ponte (não no meio da ponte). Em comum com o Tea Party, a moçada do “Ocupem Wall Street” foi tomada por uma aversão populista a Washington e Wall Street. As classes dominantes que se mexam para reocupar o seu devido lugar, de forma mais produtiva e com mais respeito aos cidadãos, eleitores e contribuintes.
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