Meanwhile in the Pacific, the String Could Snap

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Enquanto isto no Pacífico, a corda pode arrebentar

A crise na Europa é dramática (existe apenas um suspiro de alívio com a partida de Silvio Berlusconi e a aposta em governos tecnocratas na Itália e também na Grécia), existe suspense se haverá ou não um ataque israelense (e talvez americano) contra as instalações nucleares iranianas, existe ansiedade com o desengajamento dos EUA no Iraque e Afeganistão, existe muita incerteza no horizonte sobre a primavera árabe e onde está Barack Obama? O presidente americano se encontra na região da Ásia-Pacífico no meio de uma longa viagem de nove dias. São reuniões de cúpula e bilaterais que começaram no Havaí e devem se estender à Indonésia e à Austrália, com uma agenda econômica, diplomática, militar, em suma, estratégica.

Obviamente, não existe como se alienar da velha Europa ou simplesmente abandonar o Oriente Médio e o Sul da Ásia, com seus problemas espinhosos e aparentemente insolúveis. Mas o interesse americano se direciona cada vez mais para a região da Ásia-Pacífico, o motor mais possante da economia global. E não é apenas interesse e necessidade da atual administração democrata, ansiosa por acordos comerciais e mais abertura de mercados. No sábado passado, no primeiro debate devotado exclusivamente à política externa, os candidatos republicanos dedicaram o final da discussão ao relacionamento com a China (é verdade que temas internacionais se revelam secundários na campanha republicana).

E numa típica atitude de campanha, o tom foi meio belicoso no debate de sábado, a destacar do favorito Mitt Romney, que promete enquadrar a China, país, na suas palavras, “enganador” na política cambial e comercial. Tem razão, mas, caso ele chegue ao poder, como outros presidentes americanos, Romney será enquadrado na equação complexa que é lidar com a China, diante da interdependência econômica e competição estratégica. No Havaí, onde teve uma reunião bilateral com o presidente Hu Jintao, Obama também deu sua estocada, embora mais leve, dizendo que a China deve “jogar de acordo com as regras” e que a maioria dos economistas estima que a moeda chinesa esteja subvalorizada.

A China está em uma situação inusitada: já é um poder global, mas ainda sem os tentáculos militares compatíveis com a projeção econômica deste poder. Mas a mera projeção do poder chinês (e com seus crescentes investimentos militares e cotoveladas navais) é suficiente para inquietar a vizinhança. Muitos dos países da área do Pacífico têm profundas diferenças entre eles, mas em comum querem reforçar um sistema de alianças (e proteção) com os EUA. De novo, os EUA, apesar do declínio e econômico e do sufoco do momento, são e serão por décadas a única superpotência global.

No entanto, existem as pressões para o corte do orçamento militar (e aqui com exceção do incisivo isolacionista e isolado candidato Ron Paul), os postulantes republicanos preferem prometer o melhor dos mundos e fundos para o Pentágono. Mas num recente relatório, com o título “Escolhas Difíceis: Defesa Responsável em uma Era de Austeridade”, o Centro para uma Nova Segurança Americana, um grupo de estudos próximo do aparato de segurança nacional do governo Obama, ressalta que o foco deve ser “no Pacífico Ocidental e no Oceano Índico, e engajamento amplo na área do Pacífico”, enquanto se assume uma “estatégia defensiva” no Oriente Médio”. Em contraste, o relatório argumenta que a Europa é de “preocupacao terciária” e a África e América Latina merecem “a prioridade mais baixa”.

Nesta linha, num recente artigo na revista Foreign Policy, a secretária de Estado Hillary Clinton escreveu que uma das mais importantes tarefas da “arte de governar” dos EUA na próxima década será o foco em um investimento diplomático, econômico e estratégico “substancialmente maior na região da Ásia Pacífico”. E em recente visita à região, o secretário de Defesa Leon Panetta enfatizou a necessidade americana de manter ou mesmo aumentar a presença militar naquelas bandas para contrabalançar o crescente poderio chinês. Claro que um tom de urgência é a razão de ser do Pentágono para manter o seu próprio capital na estrutura de poder em Washington e justificar investimentos em novos sistema de defesa.

De qualquer forma, são prioridades militares que significam escolhas difíceis como baixar a bola em outras regiões do mundo (lembrando que crises nem sempre têm roteiros definidos, podendo explodir onde um estrategista não gostaria) ou simplesmente deixar a econômica americana sangrar ainda mais. Este último ponto será uma ironia caso um presidente republicano assuma o poder diante da insistência em ajuste fiscal dos seus candidatos.

Sim, escolhas são difíceis. Uma questão ainda mais ampla é se os EUA, na condição de superpotência no sufoco (apesar da insistência republicana sobre o caráter excepcional do país), aceitariam a idéia de menos confronto e mais partilha do poder na região Ásia-Pacífico com os chineses. A pergunta vale também para para a liderança chinesa, hoje ainda mais entretida com desafios domésticos, mas que assume uma postura cada vez mais assertiva no cenário internacional.

A realidade mais objetiva é de uma contradição fundamental e fica patente não apenas na complexa relação de interdependência e competição entre EUA e China, mas na postura dos aliados americanos na região Ásia-Pacífico. Eles querem ao mesmo tempo reforçar os laços econômicos com os chineses (dos quais são mais dependentes diante da fraqueza americana e da Europa) e atar com mais firmeza o nó da aliança militar com Washington, por temerem o poderio estratégico de Pequim. A longo prazo, a corda pode arrebentar devido às tensões e contradições.

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