The Guantanamo Problem

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Mesmo que tenhamos memória curta, esta é das tais promessas feitas com tanta solenidade e sentido de Estado, procurando marcar a diferença, que não se esfuma com facilidade. Certamente todos se recordam das circunstâncias especiais em que o então ainda recentemente empossado Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, prometeu o encerramento da prisão, melhor dizendo o centro de tortura e campo de concentração de Guantánamo.

Obama queria assim garantir que com ele tudo ia ser diferente do descrédito em que se atolara a Administração Bush, as guerras do Afeganistão e do Iraque iam acabar, Guantánamo encerrado. Podia ser, mas não é, o momento de falar do Afeganistão e do Iraque – e também da Síria, do Iémen, da Líbia, porque havia muito para dizer – e fiquemos pelo revoltante caso da prisão em território ocupado de Cuba.

Completaram-se agora dez anos sobre o funcionamento desse campo de concentração criado no interior de uma base militar usada abusivamente, graças ao poder da força, na ilha soberana de Cuba. E não se avistam no horizonte os sinais de cumprimento da promessa de Obama, está ele a um ano de terminar o mandato. Guantánamo, como prisões clandestinas espalhadas em países submissos da Europa de Leste e por outros sítios do mundo, sabe-se lá onde, é um instrumento usado pelo governo dos Estados Unidos para fugir à justiça dos Estados Unidos. Nem mais. É um centro de tortura num país que prega a todo o mundo – e ousa pretender castigar pretensos prevaricadores – contra a tortura.

Guantánamo é também um símbolo de como o homem hipócrita e sem princípios pode conspurcar a obra e a memória de homens sérios que morreram pela liberdade.

Antes de ser sinónimo de terror e vergonha, Guantánamo era o tema de uma das mais simples e comoventes canções mundiais sobre humanismo e liberdade. Era Guantanamera, palavras de José Martí, pai de Cuba independente, poema crioulo de fraternidade dedicado à mulher camponesa, guajira guantanamera, musicado na sua versão mais conhecida pelo genial Pete Seeger, incapaz, claro, de ser profeta na sua pátria norte-americana, nem ele o quer.

Guantánamo era tudo isto. Com a Serra Maestra impondo-se no horizonte quase nos fazia esquecer aquele pedaço arrogante junto ao mar ocupado desde 1902, recusando-se a Cuba independente a receber as rendas que o império diz depositar. Depois veio a “guerra contra o terrorismo”, seguida da criação daquele antro de violação dos direitos humanos explorado abusivamente pelos que apontam a dedo os seus contrariados hospedeiros por violarem os direitos humanos. Será que os valores humanos se inverteram e não demos por isso?

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