The Boston Bombings and the Insidious Victories of Terrorism

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Os actos criminosos de Boston enquadram-se na mais pura definição de terrorismo, um terrorismo sem objectivos, porque inconsequente, um terrorismo sem alvos, porque só atingiu civis inocentes, um terrorismo criminoso, porque apenas espalhou confusão, medo, morte.

As bombas de Boston tiveram contudo uma consequência numa lógica perversa que se vem desenhando desde o 11 de Setembro: a tolerância e convivência entre comunidades e credos sofreu mais um rombo. As vitórias insidiosas que o terrorismo vem alcançando são precisamente nos princípios que se esperariam estimados e consagrados na Declaração Universal de Direitos Humanos. Desde que as Torres Gémeas, em Nova Iorque, se tornaram um símbolo do poder terrorista temos assistido a uma consentida e até apoiada degradação de princípios gerais e elementares do Direito. O terrorismo vence insidiosamente quando as pessoas toleram, aceitam, apoiam restrições à liberdade de informação – oficiais ou não – intolerância inter-comunitária, negação de presunção de inocência, privação de liberdade sem culpa formada, tortura, etc.

O verdadeiro terror psicológico infundido pelos actos de violência indiscriminada levam muitos a prescindir de princípios teoricamente inabaláveis e pelos quais lutaram gerações e se travaram guerras.

A forma como alguns “media” mais conservadores se apoderaram, na década de 60 e 70 do século passado, da terminologia do poder abriu as portas a uma confusão inaceitável. Os movimentos de libertação que desde essa altura lutaram à margem dos confrontos tradicionais (caso da OLP) ou na guerrilha (de Chipre, onde foram executados pela forca dezenas de combatentes, a Angola) foram facilmente qualificados como terroristas. Agora o mesmo termo se aplica a radicais islâmicos e até a criminosos como os de Boston. Ora é importante ter presente que existe uma diferença fundamental entre os primeiros e os últimos, afinal a radicalização conservadora dos termos levou a uma perigosa confusão. Uns lutavam pela liberdade a independência, valores consagrados internacionalmente. Os outros apenas levam os cidadãos a destruir ou deixar que se destruam as liberdades e os direitos adquiridos ao longo de mais de meio século.

Para além do Direito o terrorismo tem conseguido de facto uma outra vitória dentro das sociedades. A sua identificação árabe, muçulmana e/ou islâmica está a estigmatizar comunidades pela sua origem e/ou prática religiosa. Não se trata de uma “guerra santa” de cristãos contra muçulmanos ou vice-versa, conforme o ambiente maioritário, trata-se da instalação inconsciente do medo e ódio decorrentes de actos criminosos indiscriminados.

A luta contra este terrorismo não está apenas nas mãos do Poder. O Cidadão enquanto comunidade tem de assumir essa guerra e não permitir que o seu património moral seja delapidado.

A continuarem estas vitórias insidiosas ir-se-ão acentuando os actos discriminatórios raciais e a estigmatização religiosa; a Imprensa perderá a sua objectividade abrindo as portas ao discurso do poder, em especial a televisão.

A informação/espectáculo, tanto do agrado das televisões, é uma arma que os terroristas, e sobretudo os seus mentores, sabem aproveitar a seu favor. Boletins informativos directos dos acontecimentos transformaram a informação em espectáculo. Do outro lado do ecrã, em doentio encantamento, o espectador “vive” o que são os verdadeiros momentos de glória do acto de terror. No dia seguinte o cidadão está pronto para aceitar ou votar medidas que limitam os seus direitos preparado para olhar com desconfiança para outras raças e credos. Esta é a verdadeira forma de cercear as vitórias insidiosas do terrorismo. Vitórias bem mais perigosas que o acto criminoso.

O acto criminoso extingue-se com a acção; as vitórias insidiosas têm efeitos de médio prazo que perduram a muito longo prazo.

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