Hu Wei and His Wise Words

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Hu Wei e as suas sábias palavras

António Capinha

25 Março 2022

Hu Wei não é um “zé ninguém” no contexto político chinês. É vice-presidente do Centro de Pesquisa Política Pública do Gabinete do Conselho de Estado chinês. Mas é ainda presidente de duas importantes instituições chinesas, a Associação de Pesquisa de Políticas Públicas de Shangai e a Comissão Académica do Instituto Chandar. É também professor e estudioso de questões estratégicas internacionais.

Portanto, um protagonista de algum peso no panorama político chinês.

A sua reflexão sobre a guerra da Ucrânia teve vida curta nos Media chineses. Mal o seu estudo foi publicado, desapareceu de imediato da realidade comunicacional e política da China.

O que disse então Hu Wei que incomodou tanto os dirigentes máximos da China?

Basicamente, defendeu que a China devia distanciar-se, rapidamente, da Rússia, “evitar jogos dos dois lados, abdicar da neutralidade e escolher a posição dominante no Mundo”.

Hu Wei entende que a China a continuar nestas meias tintas em que se encontra sairá, no futuro, altamente prejudicada.

São sábias as palavras de Hu Wei. Na verdade a Rússia não tem boas perspetivas à sua frente. Está isolada do Mundo, e Putin vai ser apontado, futuramente, não como um líder respeitado fazendo parte do concerto das Nações com um papel a desempenhar, mas sim como um criminoso de guerra. Alguém ignóbil que não hesita em destruir cidades, atacar civis inocentes, chacinar crianças e velhos em bombardeamentos cegos.

Esta atitude russa é, no entendimento de Hu Wei, um “erro irreversível”. Como temos escrito aqui, ainda que Putin ganhe a guerra, terá no futuro de enfrentar rebeliões dentro da Ucrânia, ficará com um país destruído. E isolado no contexto internacional!

Hu Wei, na sua reflexão, segue a linha que é a marca da maior etnia chinesa, a etnia Han, historicamente pacífica, apegada à sua terra, não belicista, não expansionista, orgulhosa da preservação do seu território. Não admira, pois, que a exemplo de quase todo o mundo, a população chinesa não deva ver com bons olhos a destruição de um país, acompanhada de uma violência e morte inimagináveis no século XXI.

Hu Wei prevê assim que a Rússia possa vir a perder a sua posição como grande potência mundial, ficando mais frágil e mais incapaz de enfrentar o Ocidente.

Uma das consequências imediatas desta guerra foi o renascer das democracias ocidentais. O Mundo reviu o que é estar do outro lado. Relembrou o que vale a liberdade, expressa na vontade do povo ucraniano. Constatou o que é a desinformação, a censura, a repressão a que estão sujeitos os russos que não concordam com a guerra. Constatou até onde pode ir um regime autocrático e déspota.

Hu Wei percebeu tudo isto e muito mais. Percebeu que os Estados Unidos renovaram a sua influência no Mundo. Que a NATO se reforçou, que os países que eram neutrais, como a Suécia, a Suíça e a Finlândia, querem colocar-se sobre a proteção do armamento Ocidental. Percebeu também que é muito possível que os países asiáticos, como o Japão ou o Vietname, se aproximem ainda mais dos Estados Unidos, alterando o contexto das forças na Ásia Pacífico, deixando a China mais sozinha nesta zona do mundo.

Ao permanecer ao lado da Rússia, a China poderá ser arrastada pelo seu isolamento. Hoje há um reforço dos valores e das instituições ocidentais, Washington ressurgiu na liderança mundial, a União Europeia, num exercício de unidade, irá virar as costas a Putin. Quando um dia Putin cair, ou for internacionalmente irrelevante, os Estados Unidos não vão ter mais, duas potências para enfrentarem, mas apenas uma, a China.

Outra das consequências da guerra da Ucrânia pode ser o fim da globalização, tal como a conhecemos hoje. A China não pode esquecer que a União Europeia, os Estados Unidos e o Reino Unido, são os seus três primeiros parceiros económicos. As trocas comerciais, incluindo exportações e importações, assumem hoje, respetivamente, o valor de 586 biliões de euros com a União Europeia, 555 biliões de euros com os Estados Unidos e 474 biliões de euros com o Reino Unido. O caos neste gigantesco mercado teria sérias consequências para os seus protagonistas em particular, e para o Mundo em geral. Tudo isto tem a assinatura de um homem-Putin.

O que perde então a China ao não clarificar a sua posição? Pode pôr em causa as suas pretensões futuras de primazia na liderança mundial. Arrisca comprometer a trajetória de crescimento económico que tem conhecido até hoje. E poderá ficar mais isolada no Mundo.

Assim sendo, seria bom que a voz de Hu Wei chegasse ao topo do conclave político chinês e que Xi Jinping em vez de a censurar, ouvisse as suas sábias palavras.

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