Esta semana imitámos Donald Trump. Ou seja, sucumbimos às primeiras impressões e às emoções.
O ex-Presidente americano tem, para nós, um efeito paradoxal. Aumenta o nosso interesse pelos Estados Unidos, o que é bom. Infelizmente, tal é conseguido à custa do aumento da nossa ignorância e do desconhecimento da história do país. Repetidamente foi-nos dito que a acusação criminal contra Trump era um acontecimento inédito na política dos Estados Unidos. De facto, foi a primeira vez em que tal sucedeu a um ex-Presidente, mas esquecemos que desde a sua fundação, mais de cem políticos americanos foram acusados e condenados em tribunal por atividades consideradas criminosas a nível federal. A corrupção tem raízes muito antigas em Washington.
Voltando a Trump, é um político determinado a quebrar todas as normas e tradições da República liberal e democrática norte-americana. A negação da legitimidade dos resultados das presidenciais de 2020, a pressão para a falsificação de resultados eleitorais no estado da Georgia e a tentativa de levar a cabo um golpe constitucional que impedisse a transferência pacífica do poder para Joe Biden, em janeiro de 2021, são alguns dos exemplos mais evidentes deste seu comportamento reiterado.
Que levou Trump a estas ações? A sua ambição e péssimo caráter, certamente. Esta explicação é, todavia, insuficiente. O ex-Presidente percebe intuitivamente que a época em que vive tem características muito específicas. O nível de vida da classe média e dos mais necessitados tem sido agravado nas últimas décadas, o endividamento das famílias, das empresas privadas e do Governo federal continua a crescer e a esperança média de vida a diminuir. Este último facto merece a nossa reflexão.
Segundo o Centro Nacional para as Estatísticas de Saúde dos Estados Unidos, nos últimos anos, a esperança média de vida no país baixou para 76,4 anos (73,5 anos para os homens; 79,3 anos para as mulheres). Algo está a correr bastante mal em termos de Saúde. Para encontramos situação semelhante no país, teríamos de recuar pouco mais de um século.
É neste contexto que Trump tenta regressar à presidência. Em 2016, tomou de assalto o Partido Republicano, eliminou as elites que o dominavam e criou um movimento político que deve, supostamente, defender os interesses e valores da classe média e dos mais desfavorecidos através da competição eleitoral. A derrota em 2020 levou-o, e a alguns dos seus apoiantes, para a via do golpe de Estado. Falharam na altura. Agora, a grande questão é saber quem liderará e qual será a agenda política deste movimento nacionalista e populista nas presidenciais de 2024.
O ponto mais relevante esta semana não é tanto a acusação em Manhattan contra Trump, antes a avaliação que ele faz das forças estruturais que se fazem sentir na sociedade dos Estados Unidos. Esta será, provavelmente, uma década turbulenta no país. A ambição de Trump é ser o catalisador da discórdia nacional para tentar reconquistar o poder. Na Europa, outros tentarão fazer o mesmo com uma agenda semelhante.
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