A destruição da família não está a ser feita pelo casamento gay e pelo feminismo dos estados azuis e liberais; está a ser feita pelo machismo dos homens dos estados vermelhos que recusam adaptar-se às famílias e às mulheres reais de 2023. Lá e cá, o populismo é o refúgio do machismo, que se sente perdido. É por isso que estes homens, lá na América e cá em Portugal, revelam um medo patético, infantil e apocalíptico em relação ao filme “Barbie” e em relação ao Mundial de Futebol. Reagem à “Barbie” e à Kika Nazareth como não reagem a Putin
Os republicanos dos estados vermelhos dizem que são os defensores dos valores da família contra a agenda antifamília dos democratas. Mas será mesmo assim? Esta crença sobrevive aos factos? Não. Para começar, como é que os alegados defensores da família apoiam um homem, Trump, que desrespeitou os valores da família em todos os momentos da sua vida? Este é só o homem que traiu a mulher com uma estrela porno no exato momento em que a mulher estava em casa com o filho recém nascido. Já agora, se a memória não me falha, a América só teve até agora dois Presidentes divorciados, ambos republicanos – Trump e Reagan
Como diz Neil deGrasse Tyson, um dos intelectuais públicos americanos que tem tentado resgatar os factos e a análise através dos factos, há outros dados curiosos que desautorizam esta arrogância moral dos republicanos. Por exemplo, o Estado com o menor número de divórcios e, portanto, com a resiliência mais apurada em nome da família é um dos corações clássicos da América azul – Massachusetts. O segundo também é azul, Illinois.
No mesmo sentido, quando olhamos para o top 10 dos Estados com mais divórcios, adivinhem o que encontramos? A grande constelação vermelha da “Bible Belt” e do fanatismo trumpista, Oklahoma, Alabama, Arkansas, Kentucky, Mississippi, Tennessee, Utah, Idaho. Como é que os Estados com mais divórcios podem assumir a liderança de uma agenda alegadamente defensora da família e com a suprema arrogância de pensar que é o outro lado que está a destruir a família?
Passa-se o mesmo na percentagem de “mães sozinhas” (single mother), isto é, famílias abandonadas pelos pais. De novo, a constelação do radicalismo vermelho aparece no topo, Mississippi, Louisiana, Alabama, Texas, Carolina do Sul. Passa-se o mesmo com filhos nascidos fora do casamento (“out of wedlock”). De novo, a liderança está no coração vermelho, Louisiana e Mississippi. E de novo é a costa leste azul que lidera no sentido oposto.
Portanto, alguma coisa está terrivelmente errada. Os republicanos dos Estados vermelhos dizem que são os defensores da família e que a agenda feminista dos democratas é uma ameaça à família. Mas então porque é que os Estados azuis têm melhores indicadores familiares e “conservadores” (menos divórcios, menos filhos fora do casamento, menos mães sozinhas e abandonadas pelos homens)?
O trumpismo vermelho e o populismo em geral não defendem a família; defendem o machismo – o que é bem diferente. Aliás, podemos dizer que a destruição da família não está a ser feita pelo casamento gay e pelo feminismo dos Estados azuis e liberais; está a ser feita pelo machismo dos homens dos Estados vermelhos que recusam adaptar-se às famílias e as mulheres reais de 2023. Lá e cá, o populismo é o refúgio do machismo, que se sente perdido. É por isso que estes homens, lá na América e cá em Portugal, revelam um medo patético, infantil e apocalíptico em relação ao filme “Barbie” e em relação ao Mundial de Futebol. Reagem à “Barbie” e à Kika Nazareth como não reagem a Putin.
O problema destes homens ‘vermelhos’ que votam no populismo nos EUA e na Europa é este: são incapazes de se adaptar ao papel de pai e de cuidador em igualdade de tarefas domésticas com a mulher. Quando a criança fica doente, porque é que tem de ser ela – e não ele – a sacrificar a sua carreira nos anos decisivos? Tudo gira em torno desta questão. O colapso da família hoje em dia vem desse machismo – e não da igualdade. Os Estados azuis e liberais cheios de homens “amaricados” – na visão trumpista – são muito mais conservadores e amigos da família.
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