2024 Is a Test for Democracy*

<--

Na primeira crónica do ano escrevo sobre 2024, o ano de todas as eleições. No plano internacional, há eleições nos Estados Unidos da América, na Índia, na Indonésia, na África do Sul, em Taiwan, entre outros países, apenas para referir os países democráticos. Na Europa há eleições para o Parlamento Europeu e em vários países da União Europeia — Bélgica, Áustria, Finlândia e, claro, Portugal — e ainda no Reino Unido.

Todos estes atos eleitorais correspondem ao normal funcionamento da democracia, mesmo com todos os fatores que por vezes a condicionam (do uso de inteligência artificial e de bots às notícias falsas), devendo, por isso, os seus resultados ser respeitados.

Isso não significa, contudo, que não haja razões para preocupação, até pelo facto de estas eleições acontecerem quando continuam sem resolução os conflitos internacionais na Ucrânia e em Gaza, com enormes consequências humanitárias, geopolíticas e económicas.

Um crescimento dos partidos populistas de extrema-direita antieuro­peístas nas eleições para o Parlamento Europeu terá efeitos muito graves ao nível das políticas de imigração, dos direitos das minorias e das mulheres, do respeito pelas instituições democráticas e também no apoio à Ucrânia. A vitória destes partidos em vários paí­ses europeus — Itália, e Hungria, onde governam, mas também na Áustria e na Finlândia, países em que lideram as intenções de voto para as eleições de 2024, bem como na Suécia e na Grécia, onde têm grande representação parlamentar — já teve por efeito deslocar o próprio centro político para a direita e põe em risco o pluralismo.

Nos EUA, o cenário pode ainda ser pior se Trump ganhar as eleições em novembro. Apesar de os Estados do Colorado e do Maine o terem impedido de concorrer às primárias devido ao papel que teve na invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021 (facto que, numa democracia, devia por si só afastá-lo da possibilidade de concorrer), continua a ser favorito para ganhar a nomeação do Partido Republicano. No plano interno, a democracia pode vir a sofrer um rude golpe, generalizando-se o desrespeito pelas instituições e pelos direitos humanos, bem como a desinformação e o discurso de ódio. No plano internacional, além das consequências gravíssimas para o combate às alterações climáticas, a ONU e a NATO ficarão muito diminuídas na sua capacidade de intervenção, permitindo a implantação à escala mundial da lei do mais forte. A Ucrânia será deixada à sua sorte perante a Rússia de Putin. E os israe­litas terão seguramente apoio para continuar a sua guerra de extermínio em Gaza.

Na Argentina, não sabemos o que a loucura de Milei nos reserva para 2024… para já, tem governado por decreto, para contornar o facto de não ter maioria no Congresso, e as imagens da repressão dos protestos dos últimos dias têm trazido à mente a memória da ditadura militar.

É verdade que todos estes riscos decorrem de eleições livres em países democráticos. Essa é, sem dúvida, a superioridade ética da democracia. Ao contrário dos ditadores, os democratas respeitam os resultados eleitorais, mesmo quando podem pôr em causa o regime democrático. Mas até esse cenário se verificar — e espero que tal não suceda — devemos estar atentos e lutar para evitar o crescimento destas forças. Desde logo em Portugal, sobretudo no ano em que se comemoram os 50 anos do 25 de Abril.

About this publication