Para ficar na Casa Branca, Biden precisa enfrentar Trump e Murdoch
Dono da Fox conspira para eleger e sabotar governos há décadas, mas há um cenário especialmente nefasto em 2024
No próximo dia 16, um júri em Nova York vai decidir o valor da indenização que Donald Trump deve pagar à ex-colunista da revista Elle E. Jean Carroll.
Em maio passado, Trump foi considerado culpado de agressão sexual e difamação da jornalista, num julgamento civil. Mas só foram informados dos detalhes e da gravidade da acusação os americanos que não consomem uma dieta de mídia restrita à trumposfera –não só a dominante Fox News, como One America Network, Newsmax e outras cloacas digitais na franja da desinformação.
O sistema bipartidário americano tem origem no final do século 18, mas a objetividade como guia da cobertura política é um fenômeno bem mais novo —tem apenas um século.
Mais do que em qualquer eleição recente, o ano nos Estados Unidos vai ser marcado por um expressivo desequilíbrio: um conglomerado de mídia está em campanha pelo Partido Republicano, não importa o candidato.
Se o presidente Joe Biden for confirmado o candidato democrata à reeleição, vai ter um poderoso adversário além de Donald Trump ou de quem quer que seja o concorrente republicano: Rupert Murdoch. O decrépito semiaposentado australiano de 92 anos, dono da Fox, a mais assistida TV a cabo americana, vem conspirando para eleger e sabotar governos na sua terra natal, no Reino Unido e nos EUA há décadas, mas há um cenário especialmente nefasto em 2024.
Depois da invasão do Capitólio, em 2021, Murdoch quis abandonar Trump, mas o culto ao ex-presidente ainda forma a audiência que contribui para o faturamento da Fox. A diferença entre o candidato do caos, derrotado em 2020, e o escancarado aspirante a Mussolini, em 2024, é a radicalização ainda maior dos eleitores trumpistas e a normalização da mentira pela Fox News e imitadores.
Não há fato que mereça descrição objetiva se for favorável a Joe Biden. O relatório federal sobre novos empregos foi o dobro do previsto? O popular âncora da Fox noticia o relatório como “um escândalo.” Não há distinção entre cobertura econômica, política ou científica. Tudo é propaganda.
Desde que o grotesco empresário alaranjado desceu a escada rolante da Trump Tower, em junho de 2015, ainda pré-candidato azarão, nem o Partido Democrata nem os liberais americanos conseguiram articular um ecossistema de informação que enfrente o trator Murdoch.
As palavras têm peso. O escritor Jeff Sharlett critica o tabu com o uso do termo “fascismo” e é contra jornalistas optarem por “crise da democracia”, porque “crise” sugere que se trata de uma história com começo, meio e fim. Mas “fascismo”, ele argumenta, é o termo preciso para definir o culto à personalidade num movimento político que oferece o homem forte como solução para tudo, o líder que está acima das leis e, especialmente, celebra a violência.
Um exame publicado em novembro pela Columbia Journalism Review mostrou um número irrisório de artigos de análise na cobertura sobre política nacional das capas de jornais americanos, na eleição de 2022. É impossível noticiar a aberração Donald Trump apenas com descrição factual.
Se um empresário de mídia de centro ou de esquerda tivesse tratado o candidato Ronald Reagan com a negligência criminosa de Murdoch, a licença de transmissão do canal teria sido debatida pelo governo. É tarde demais para enfrentar o Frankenstein que sucessivos reguladores federais ignoraram.
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