Com o padre László Ladány S.J. (1914-1990) e Simon Leys (1935-2014) aprendi a importância de seguir a imprensa oficial da China. O que lá é afirmado em linguagem partidária é relevante para interpretarmos a forma como a liderança do Partido Comunista da China (PCC) olha para o país e avalia o seu posicionamento no mundo.
Nos últimos anos, o tom dos artigos publicados no “Diário do Povo” sobre os EUA tem sido cada vez mais crítico. Em Pequim, a perceção de Washington é ambivalente. A América está em declínio, mas também ambiciona destruir o PCC e conter a afirmação da China na Ásia e no mundo. Todavia, numa carta pessoal recente a Harry Moyer e Melvin McMullen, antigos pilotos norte-americanos que combateram ao lado da China nacionalista na unidade liderada por Claire Lee Chennault contra o império japonês em 1941-42, Xi Jinping escreveu que “as relações China-EUA necessitam de uma nova geração de Tigres Voadores”. Esta referência histórica é importante.
Na quarta-feira, Xi Jinping teve um encontro bilateral com Joe Biden à margem da cimeira da APEC em São Francisco, uma cidade em que um quinto da população tem ascendência chinesa. Xi Jinping partiu para a conversa com Biden e líderes empresariais norte-americanos com três objetivos. O primeiro foi comunicar-lhes a firme oposição do PCC à política que a Casa Branca e o Congresso dos EUA têm seguido em relação a Taiwan. Pequim quer uma garantia clara de que Washington não apoiará a independência unilateral da ilha que terá eleições presidenciais em janeiro. O segundo foi tentar persuadir a Administração Biden que é mutuamente conveniente acabar com o embargo à exportação de produtos de alta tecnologia norte-americana para as empresas chinesas. Por fim, Xi Jinping precisa de continuar a atrair investimento direto estrangeiro e conhecimentos para a modernização da sua economia.
A dificuldade do líder da China é o impacto da geografia na governação do país e a crescente rigidez ideológica do PCC, que lidera desde há uma década. Há 1500 anos, a dimensão e a diversidade geográfica e cultural do território levaram a dinastia Sui a construir um sistema político chinês centralizado, hierárquico e burocrático. Com o tempo, tal permitiu a construção de um Estado mais forte mas alérgico à descentralização, diversidade e inovação política. A ideologia marxista-leninista de Xi Jinping reforça esta tendência histórica e impede as reformas económicas que a China necessita de fazer. Em Washington e na Ásia, a dúvida é se os problemas da economia chinesa provocados pelo crescimento da dívida, baixa procura interna e a crescente claustrofobia política imposta pelo PCC, levarão ou não Pequim a correr mais riscos políticos. A resposta é crucial para os investidores estrangeiros.
A trajetória das relações entre Pequim e Washington explica a importância do encontro de Xi Jinping com Biden em São Francisco. Ambos os lados tentam definir e negociar os termos em que a sua competição estratégica terá lugar daqui para a frente no meio de riscos, custos, dificuldades domésticas e algumas oportunidades. Da sua avaliação dependerá em grande parte o nosso futuro.
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