Rabiscos Estratégicos (Os EUA e o Mundo Islâmico)
Gerald Seib, o veterano colunista político e ex-correspondente no Oriente Médio do Wall Street Journal, é sempre uma referência ilustrativa para saber o se passa na “cabeça” do establishment de Washington. Seib pode ser qualificado em linhas gerais de analista isento no meio da estridência ideológica. Ele contribui para o debate com a coluna que leva o título “Como os EUA Devem Lidar com o Mundo Islâmico”?
O debate claro foi agilizado e ficou mais tenso com os protestos antiocidentais dos últimos dias no mundo islâmico e o assassinato de diplomatas norte-americanos na Líbia. Na expressão de Seib, os protestos na esteira da divulgação de um tosco vídeo, produzido na Califórnia, ridicularizando o profeta Maomé, são sinais tanto de um profundo sentimento antiamericano e de uma vasta ignorância sobre como a vida americana funciona (basicamente culpar o governo pelo o que é feito na esfera privada de liberdade de expressão).
Como reagir? Sucessivos governos americanos (republicanos e democratas) usaram força militar contra adversários islâmicos e ao mesmo tempo deram apoio a nascentes movimentos democráticos que, como ficou patente agora, para o melhor ou para o pior, fortaleceram líderes islamistas. A questão é sobre o grau de assertividade americano sobre os governos que estão sendo forjados na Primavera Árabe, mas podemos ir além e incluir também Iraque, Paquistão e Afeganistão.
Na narrativa de Seib, para simplificar, existem três opções:
1) Cair fora do mundo islâmico. O ódio antiamericano não vai suavizar e a tendência é de menor dependência de petróleo do Oriente Médio
2) Tentar impor os valores e interesses americanos.
3) Tolerar estes novos líderes, mesmo quando são hostis, pois nada melhor existe para os interesses americanos.
Em termos simplistas, isolacionistas (hoje encastelados no Tea Party) favorecem a primeira opção. Mitt Romney e os republicanos são simpáticos à segunda opção, enquanto Barack Obama e os democratas ficam com a terceira. O establishment rejeita a primeira opção e a questão é se haverá compromissos entre a segunda e a terceira em função dos resultados eleitorais, não apenas na corrida para a Casa Branca, mas na composição do Congresso.
A questão ampla para o debate é sobre a validade ou não de apoiar governos islâmicos dispostos a resistir ao extremismo nestes tempos de transição, mesmo que não sejam ideais para os valores e interesses americanos.
Outro analista que reflete bem a conversa do establishment (e neste caso, global), é Philip Stephens, do jornal Financial Times. Ele dá uma contribuição interessante para o debate. Para Stephens, sob renovação da administração Obama ou sob o novo gerente Romney, os EUA deverão continuar na condição de nação mais poderosa do mundo, mas o foco e as ambições serão mais estreitas, apesar da narrativa sobre os exageros do excepcionalismo USA! USA! USA!, bradada com mais rigor pelos republicanos, mas também entoada pelos democratas.
Será cada vez mais difícil para os EUA controlarem os eventos (e não apenas no Oriente Médio). A superpotência americana irá agir de forma mais seletiva (e aqui alertas isolacionistas e de necessidade de mais rigor fiscal fazem sentido e soam menos delirantes). Basta ver o menor apetite da opinião pública norte-americana por excursões militares, como no Afeganistão e Iraque.
Um país com suas vantagens geográficas, de recursos naturais, dinamismo interno e capacidade de dar a volta por cima pode se dar ao luxo de uma retração imperial. Com esta retração norte-americana e outras potências em alta, o cenário nas próximas décadas será de um multilateralismo remendado. Podemos visualizar, por este raciocínio, vácuo de poder, turbulências e relutâncias de aliados e rivais dos EUA para assumirem responsabilidades.
Teremos mais competição, insegurança e instabilidade, com a incapacidade dos EUA para serem garantidores da ordem internacional em favor deste papel de superpotência seletiva. Philip Stephens arremata que a Pax Americana tem suas falhas, mas seus críticos vão lamentar sua partida.
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