Um terceiro pacote de fotos íntimas de famosas vazou na internet neste fim de semana. Mas um caso, na semana passada, chamou a atenção: depois de um discurso na Organização das Nações Unidas (ONU), a atriz Emma Watson, que falou sobre a descriminação por gênero, foi “vítima” de um site afirmando que ela seria a próxima a ter fotos divulgadas quando um “contador” chegasse a zero. Quando isso aconteceu, entretanto, visitantes foram redirecionados para a página de uma agência de publicidade, pedindo pelo desligamento do site 4chan, onde as fotos das famosas foram distribuídas.
“Junte-se a nós para derrubar o 4chan e impedir que mais fotos particulares sejam vazadas. Nenhuma dessas mulheres mereceu isso, e juntos podemos fazer a mudança. Emmayouarenext.com chegou a 48 milhões de visitantes, sete milhões de compartilhamentos no Facebook e três milhões de menções no Twitter no mundo todo”, dizia a página.
O site da agência responsável pelo site, a Rantic, tinha uma carta endereçada ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, afirmando que o grupo foi contratado por celebridades para aumentar a discussão sobre o vazamento das fotos. “Os vazamentos de fotos nuas de celebridade no site 4chan nesses últimos dois meses foi uma invasão da privacidade e também um claro indicativo de que a internet precisa ser censurada”, dizia a carta.
O site “The Verge” observou o amadorismo da campanha supostamente patrocinada por famosos. Nenhum nome foi mencionado.
Mas o que é, afinal, o site 4chan?
O 4chan é um site que reúne diversos fóruns onde usuários publicam imagens. Muitos dos fóruns permitem ou até exigem o anonimato. Esse ambiente dá espaço para todo tipo de conteúdo. A comunicação por meio de imagens deu origem a muitos dos chamados “memes” da internet: é mais efetivo publicar uma imagem que expressa algo do que escrever.
O site possui moderadores que apagam conteúdos claramente ilícitos, mas a quantidade de postagens é tanta que muita coisa fica fora dos radares e acaba esquecida, já que não é fácil obter conteúdo antigo. Os usuários do 4chan, embora não sejam todos experts em tecnologia, sabem como divulgar um conteúdo na internet. Basta uma publicação interessante no 4chan para que logo a web inteira esteja sabendo.
Em 2006, um norte-americano publicou uma ameaça dizendo que sete bombas em estádios de futebol americano matariam cem mil pessoas. O autor, inicialmente anônimo, foi identificado como Jake Brahm e sentenciado a seis meses de prisão. Brahm, no entanto, não tinha bomba nenhuma: era apenas um “trote”.
O conteúdo do 4chan é conhecido por ser de baixa qualidade. Muitas imagens são falsas, editadas e publicadas por brincadeira – brincadeiras de mau gosto, segundo o entendimento de muitos. De fato, muitas das fotos de celebridades também foram falsificadas, algo nada surpreendente para quem conhece o 4chan.
Apesar disso, ou talvez por causa disso, o 4chan tem um público – um público enorme: o site é o 672º mais visitado do mundo e o 263º mais visitado nos Estados Unidos, segundo a Alexa. Acabar com o 4chan não acaba com esse público, nem com a cultura que já se criou em torno do site, que é provavelmente a maior cultura de massa própria e exclusiva da web e que também foi berço do movimento “Anonymous”, organizador de protestos na web e fora dela.
Um novo grupo de moderadores tem atuado no 4chan recentemente, alienando muitos dos usuários. O resultado? Parte do público está migrando para outro site, o “8chan”.
Mais importante ainda é entender que, embora o 4chan dê público para esses vazamentos, não é difícil achar público em outros lugares da web. Quem precisa ser punido é quem de fato obteve essas imagens. Aliás, muita gente que viu as fotos provavelmente nem conhece o 4chan.
Como observou uma interessante reportagem de Andy Greenberg para o blog de segurança da revista “Wired”, há outros sites, como o Anon-IB, que servem de ponto de encontro para quem pretende obter imagens de famosas. Na Anon-IB, participantes discutem abertamente métodos para invadir as contas, embora, como conta Greenberg, as discussões têm se transformado em lamentações desde que a Apple decidiu melhorar a segurança do iCloud.
Com certeza, muitos outros lugares semelhantes existem na internet – alguns ainda menos conhecidos. O 4chan é o alvo fácil, porque é grande, mas o interesse generalizado por esses conteúdos não vai acabar apenas com a retirada de um site do ar.
Soluções imediatistas como essa às vezes soam bem, mas não resolvem o problema e, nesse caso, traria um preocupante precedente de censura. Por mais que o 4chan tenha lixo, há discussões válidas, entre a própria comunidade, compartilhamento de conteúdo verdadeiramente interessante e a curiosa capacidade de movimentar milhares de pessoas por uma causa, como o Anonymous demonstrou.
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